segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Um século injustiçado

DAVID COIMBRA

Faça uma experiência antropológica. Perca um pouco do seu tempo e “navegue” pela internet. Assista ao que é mais assistido e leia o que é mais comentado nas chamadas “redes sociais”. Você ingressará em um mundo sombrio, uma espécie de pré-humanidade, onde não interessa o conteúdo, onde não existe reflexão, o que importa é a sensação. O que vinga é a velocidade e a superficialidade. O que faz sucesso faz sucesso apenas porque faz sucesso. 

Pergunta: por que milhões de pessoas acessaram o tal vídeo da “Luíza está no Canadá”? 

Resposta: porque milhões de pessoas acessaram o tal vídeo da “Luíza está no Canadá”. 

As pessoas se ofendem por causa de times de futebol, descobrem conspirações políticas embaixo de cada acento circunflexo e tecem interpretações de texto que independem do que está escrito. É como se o homem tivesse descido um degrau da escada evolutiva, como se tivesse sido rebaixado de nível. Você se perguntará o que está acontecendo com as pessoas, jogará suas mãos para o céu e bradará: 

– Senhor! Em que valhacouto de semianalfabetos se transformou o século 21? 

Mas você estará errado. Estará cometendo uma injustiça com o século 21. O século 21 não trouxe mudança alguma. Por um motivo rasteiro: 

Porque as pessoas sempre foram assim. 

Eis uma das obras mais admiráveis da internet: a exposição do lado obscuro do homem comum. Com a internet, as pessoas estão desprotegidas de suas próprias opiniões. Elas tornam público o que pensam sem nenhum filtro, muito menos o da própria reflexão. 

Antes do advento da internet, não eram muitos os indivíduos vitimados por suas opiniões. Expunham-se alguns jornalistas, alguns artistas e algumas “autoridades”. Só esses propalavam bobagens em público. O mundo parecia mais sensato. Não pela qualidade; pela quantidade. 

Mas a tecnologia das comunicações foi se sofisticando. No fim do século 20, com a facilidade da interatividade, leitores não apenas liam, escreviam; ouvintes não se contentavam em ouvir, queriam falar; telespectadores não se limitavam a assistir, faziam tudo para aparecer. 

E, por fim, a internet surgiu e, numa ânsia de se expressar, todos passaram a falar, a escrever, a dançar, a cantar, a declamar, a discursar, a representar e a propagar suas ideias. Todos têm ideias, uma tragédia. Assim, o mundo do século 21 parece ter se transformado num lugar infestado de idiotas. Ilusão. A diferença é que antes as pessoas estavam protegidas pelo silêncio. 

E esse é o grande ensinamento a se tirar disso tudo: o silêncio é uma bênção. O silêncio protege. Portanto, não repita bordões da internet, não tente ser sábio em 140 toques, não publique intimidades no Facebook. Fique quieto. Você parecerá mais inteligente.

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