domingo, 31 de maio de 2009

Navegue


Navegue, descubra tesouros, mas não os tire do fundo do mar, o lugar deles é lá.
Admire a lua, sonhe com ela, mas não queira trazê-la para a terra.
Curta o sol, se deixe acariciar por ele, mas lembre-se que o seu calor é para todos. Sonhe com as estrelas, apenas sonhe, elas só podem brilhar no céu.
Não tente deter o vento, ele precisa correr por toda parte, ele tem pressa de chegar sabe-se lá onde.
Não apare a chuva, ela quer cair e molhar muitos rostos, não pode molhar só o seu. As lágrimas? Não as seque, elas precisam correr na minha, na sua, em todas as faces. O sorriso! Esse você deve segurar, não deixe-o ir embora, agarre-o!
Quem você ama? Guarde dentro de um porta jóias, tranque, perca a chave! Quem você ama é a maior jóia que você possui, a mais valiosa. Não importa se a estação do ano muda, se o século vira e se o milênio é outro, se a idade aumenta; conserve a vontade de viver, não se chega à parte alguma sem ela. Abra todas as janelas que encontrar e as portas também.
Persiga um sonho, mas não deixe ele viver sozinho. Alimente sua alma com amor, cure suas feridas com carinho.Descubra-se todos os dias, deixe-se levar pelas vontades, mas não enlouqueça por elas. Procure, sempre procure o fim de uma história, seja ela qual for.Dê um sorriso para quem esqueceu como se faz isso.
Acelere seus pensamentos, mas não permita que eles te consumam. Olhe para o lado, alguém precisa de você. Abasteça seu coração de fé, não a perca nunca.
Mergulhe de cabeça nos seus desejos e satisfaça-os. Agonize de dor por um amigo, só saia dessa agonia se conseguir tirá-lo também. Procure os seus caminhos, mas não magoe ninguém nessa procura. Arrependa-se, volte atrás, peça perdão! Não se acostume com o que não o faz feliz, revolte-se quando julgar necessário.
Alague seu coração de esperanças, mas não deixe que ele se afogue nelas. Se achar que precisa voltar, volte! Se perceber que precisa seguir, siga! Se estiver tudo errado, comece novamente. Se estiver tudo certo, continue. Se sentir saudades, mate-a. Se perder um amor, não se perca! Se achá-lo, segure-o!
"Circunda-te de rosas, ama, bebe e cala. O mais é nada".
(Fernando Pessoa)

sábado, 30 de maio de 2009

Joana D'Arc morre na fogueira


1431: Joana D'Arc morre na fogueira

Großansicht des Bildes mit der Bildunterschrift: Hoje, Joana de Orleans é um símbolo nacional para os franceses
No dia 30 de maio de 1431, Joana D'Arc foi queimada numa fogueira em praça pública, na cidade francesa de Rouen. A jovem filha de camponeses havia liderado a luta contra a ocupação inglesa, em 1429, na Guerra dos Cem Anos.

Napoleão Bonaparte certa vez disse: "Um francês pode fazer milagres ao ver a independência do país ameaçada". Ainda hoje, Joana D'Arc é um símbolo nacional para os franceses. Vários livros com sua biografia e filmes foram lançados sobre a ingênua, mas corajosa filha de lavradores do interior da França. Joana D'Arc nasceu em Domrèmy-la-Pucelle na noite de Epifania de 1412. Já em vida, foi uma legenda, as pessoas queriam vê-la e tocá-la. Em 1429, entrou para a história da França ao escrever uma carta ao chefe da ocupação inglesa:

"Rei da Inglaterra, auto-intitulado regente do Império Francês, entregue à virgem enviada por Deus, imperador do céu, a chave de todas as cidades que Sua Alteza tomou dos franceses. Se não o fizer, Sua Alteza já o sabe, eu sou general. Em todo lugar na França que encontrar da sua gente, vou expulsá-la."

Teria sido ousadia ou ingenuidade a oferta feita por Joana, então com 16 anos, ao seu rei, Carlos 7º, de expulsar os invasores ingleses de Orleans e assim ajudá-lo a garantir-se no trono da França? Ao se apresentar como enviada divina, ajudou a projetar seu nome na história.

Oficialmente, ninguém contestava a necessidade de expulsar os britânicos, mesmo assim o rei e seus consultores preferiram mandar averiguar quem era aquela jovem. Doutores, religiosos, guerreiros, ninguém encontrou ressalvas à pura Joana, apenas o bem, a inocência, humildade, honestidade e submissão.

Enviado por Deus

Joana apareceu para salvar os franceses justamente no momento em que eles acreditavam que apenas um milagre poderia ajudá-los. E a Joana vestida de guerreiro, um enviado de Deus, incorporou esta esperança. O povo via nela a concretização de um antiga profecia, segundo a qual a França seria salva por uma virgem. Uma propaganda ideal para a corte. Era a oportunidade para motivar suas tropas, que a esta altura estavam com a imagem um tanto desgastada.

Joana, a salvadora. Com o passar dos séculos, ela foi chamada de tudo: bruxa, prostituta, santa, feminista, nacionalista, heroína. Pelo ultraconservador Le Pen, na França atual, ela foi inclusive usada como símbolo contra os invasores modernos. E, na tela, é apresentada como um tipo de adolescente rebelde, altruísta, apegado aos ideais.

Mas, retrocedendo na história: depois que ela foi sabatinada por uma comissão da corte, recebeu o uniforme completo de cavaleiro e começou a lutar pela libertação. Orleans estava sitiada pelos ingleses há seis meses. Uma tropa de cinco mil homens pretendia forçar os 30 mil habitantes a se entregar. Apesar de não ser um integrante ativo nos planos dos militares franceses, o espírito de luta de Joana - e talvez apenas sua presença - trouxe a vitória aos franceses.

No dia 8 de maio de 1429, ela foi festejada pelos moradores de Orleans como enviada divina. E seguiram-se ainda muitas vitórias até a coroação de Carlos VII em Reims. Os ingleses, derrotados, iniciaram uma conspiração contra Joana, que acusavam de bruxaria. Ela foi presa em 1430 e condenada pela Inquisição a morrrer na fogueira, depois de 20 meses de julgamento.
Jens Teschke (rw)

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Oficialmente Velho


Por Leonardo Boff
Neste mês de dezembro completei 70 anos. Pelas condições brasileiras, me torno oficialmente velho. Isso não significa que estou próximo da morte, porque esta pode ocorrer já no primeiro momento da vida. Mas é uma outra etapa da vida, a derradeira. Esta possui uma dimensão biológica, pois irrefreavelmente o capital vital se esgota, nos debilitamos, perdemos o vigor dos sentidos e nos despedimos lentamente de todas as coisas. De fato, ficamos mais esquecidos, quem sabe, impacientes e sensíveis a gestos de bondade que nos levam facilmente às lágrimas.
Mas há um outro lado, mais instigante. A velhice é a última etapa do crescimento humano. Nós nascemos inteiros. Mas nunca estamos prontos. Temos que completar nosso nascimento ao construir a existência, ao abrir caminhos, ao superar dificuldades e ao moldar o nosso destino. Estamos sempre em gênese. Começamos a nascer, vamos nascendo em prestações ao longo da vida até acabar de nascer. Então entramos no silêncio. E morremos.
A velhice é a última chance que a vida nos oferece para acabar de crescer, madurar e finalmente terminar de nascer. Neste contexto, é iluminadora a palavra de São Paulo: ”na medida em que definha o homem exterior, nesta mesma medida rejuvenece o homem interior” (2Cor 4,16). A velhice é uma exigência do homem interior. Que é o homem interior? É o nosso eu profundo, o nosso modo singular de ser e de agir, a nossa marca registrada, a nossa identidade mais radical. Esta identidade devemos encará-la face a face.
Ela é pessoalíssima e se esconde atrás de muitas máscaras que a vida nos impõe. Pois a vida é um teatro no qual desempenhamos muitos papéis. Eu, por exemplo, fui franciscano, padre, agora leigo, teólogo, filósofo, professor, conferencista, escritor, editor, redator de algumas revistas, inquirido pelas autoridades doutrinais do Vaticano, submetido ao “silêncio obsequioso” e outros papéis mais. Mas há um momento em que tudo isso é relativizado e vira pura palha. Então deixamos o palco, tiramos as máscaras e nos perguntamos: Afinal, quem sou eu? Que sonhos me movem? Que anjos que habitam? Que demônios me atormentam? Qual é o meu lugar no desígnio do Mistério? Na medida em que tentamos, com temor e tremor, responder a estas indagações vem à lume o homem interior. A resposta nunca é conclusiva; perde-se para dentro do Inefável.
Este é o desafio para a etapa da velhice. Então nos damos conta de que precisaríamos muitos anos de velhice para encontrar a palavra essencial que nos defina. Surpresos, descobrimos que não vivemos porque simplesmente não morremos, mas vivemos para pensar, meditar, rasgar novos horizontes e criar sentidos de vida. Especialmente para tentar fazer uma síntese final, integrando as sombras, realimentando os sonhos que nos sustentaram por toda uma vida, reconciliando-nos com os fracassos e buscando sabedoria. É ilusão pensar que esta vem com a velhice. Ela vem do espírito com o qual vivenciamos a velhice como a etapa final do crescimento e de nosso verdadeiro Natal.
Por fim, importa preparar o grande Encontro. A vida não é estruturada para terminar na morte mas para se transfigurar através da morte. Morremos para viver mais e melhor, para mergulhar na eternidade e encontrar a Última Realidade, feita de amor e de misericórdia. Aí saberemos finalmente quem somos e qual é o nosso verdadeiro nome.
Nutro o mesmo sentimento que o sábio do Antigo Testamento: ”contemplo os dias passados e tenho os olhos voltados para a eternidade”.
Por fim, alimento dois sonhos, sonhos de um jovem ancião: o primeiro é escrever um livro só para Deus, se possível com o próprio sangue; e o segundo, impossível, mas bem expresso por Herzer, menina de rua e poetisa: “eu só queria nascer de novo, para me ensinar a viver”. Mas como isso é irrealizável, só me resta aprender na escola de Deus. Parafraseando Camões, completo: mais vivera se não fora, para tão longo ideal, tão curta a vida.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

A crise que estamos esquecendo

Por Lya Luft
O tema do momento é a crise financeira global. Eu aqui falo de outra, que atinge a todos nós, mas especialmente jovens e crianças: a violência contra professores e a grosseria no convívio em casa. Duas pontas da nossa sociedade se unem para produzir isso: falta de autoridade amorosa dos pais (e professores) e péssimo exemplo de autoridades e figuras públicas.
Pais não sabem como resolver a má-criação dos pequenos e a insolência dos maiores. Crianças xingam os adultos, chutam a babá, a psicóloga, a pediatra. Adolescentes chegam de tromba junto do carro em que os aguardam pai ou mãe: entram sem olhar aquele que nem vira o rosto para eles. Cumprimento, sorriso, beijo? Nem pensar. Como será esse convívio na intimidade? Como funciona a comunicação entre pais e filhos? Nunca será idílica, isso é normal: crescer é também contestar. Mas poderíamos mudar as regras desse jogo: junto com afeto, deveriam vir regras, punições e recompensas. Que tal um pouco de carinho e respeito, de parte a parte? Para serem respeitados, pai e mãe devem impor alguma autoridade, fundamento da segurança dos filhos neste mundo difícil, marcando seus futuros relacionamentos pessoais e profissionais. Mal-amados, mal-ensinados, jovens abrem caminho às cotoveladas e aos pontapés.
Mal pagos e pouco valorizados, professores se encolhem, permitindo abusos inimagináveis alguns anos atrás. Uma adolescente empurra a professora, que bate a cabeça na parede e sofre uma concussão. Um menininho chama a professora de “vadia”, em aula. Professores levam xingações de pais e alunos, além de agressões físicas, cuspidas, facadas, empurrões.
Cresce o número de mestres que desistem da profissão: pudera. Em escolas e universidades, estudantes falam alto, usam o celular, entram e saem da sala enquanto alguém trabalha para o bem desses que o tratam como um funcionário subalterno. Onde aprenderam isso, se não, em primeira instância, em casa? O que aconteceu conosco? Que trogloditas somos – e produzimos –, que maltrapilhos emocionais estamos nos tornando, como preparamos a nova geração para a vida real, que não é benevolente nem dobra sua espinha aos nossos gritos? Obviamente não é assim por toda parte, nem os pais e mestres são responsáveis por tudo isso, mas é urgente parar para pensar.
Na outra ponta, temos o espetáculo deprimente dos escândalos públicos e da impunidade reinante. Um Senado que não tem lugar para seus milhares de funcionários usarem computador ao mesmo tempo, e nem sabia quantos diretores tinha: 180 ou trinta?
Autoridades que incitam ao preconceito racial e ao ódio de classes? Governos bons são caluniados, os piores são prestigiados. Não cedemos ao adversário nem o bem que ele faz: que importa o bem, se queremos o poder? Guerra civil nas ruas, escolas e hospitais precários, instituições moralmente falidas, famílias desorientadas, moradias sub-humanas, prisões onde não criaríamos porcos. Que profunda e triste impressão, sobretudo nos mais simples e desinformados e naqueles que ainda estão em formação. Jovens e adultos reagem a isso com agressividade ou alienação em todos os níveis de relacionamento. O tema “violência em casa e na escola” começa a ser tratado em congressos, seminários, entre psicólogos e educadores. Não vi ainda ações eficazes.
Sem moralismo (diferente de moralidade) nem discursos pomposos ou populistas, pode-se mudar uma situação que se alastra – ou vamos adoecer disso que nos enoja. Quase todos os países foram responsáveis pela gravíssima crise financeira mundial. Todos os indivíduos, não importa a conta bancária, profissão ou cor dos olhos, podem reverter esta outra crise: a do desrespeito geral que provoca violência física ou grosseria verbal em casa, no trabalho, no trânsito. Cada um de nós pode escolher entre ignorar e transformar. Melhor promover a sério e urgentemente uma nova moralidade, ou fingimos nada ver, e nos abancamos em definitivo na pocilga.

quarta-feira, 27 de maio de 2009

A Conspiração da Dúvida

Por Al Gore
Por Que o Público Não Sabe do Tamanho da Crise Ambiental
Al Gore é ex-vice-presidente dos EUA e ganhou o Prêmio Nobel da Paz por sua ação em defesa do equilíbrio ecológico em escala global. No texto a seguir ele mostra a conspiração criminosa de alto nível − envolvendo o governo do ex-presidente George W. Bush e companhias multinacionais − para que pouco ou nada seja feito em relação à crise ambiental causada pelo excesso de dióxido de carbono na atmosfera. A conspiração é internacional e está longe de ser vencida − como demonstra, por exemplo, a estranha omissão que há no Brasil diante do desafio criado pela mudança climática.
(O Editor)
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O risco ambiental estratégico mais bem conhecido e, de longe, o mais sério é a crise climática. Para mim, esta questão está em uma categoria especial, em função dos problemas que acarreta. Preocupo-me particularmente porque a grande maioria dos cientistas ambientais mais respeitados de todo o mundo fez soar um alarme claro e urgente. A comunidade internacional − incluindo os EUA − deu início a uma enorme iniciativa, há vários anos, para montar um levantamento científico mais preciso com as evidências cada vez mais numerosas de que o ambiente da Terra está sofrendo danos severos e potencialmente irreparáveis decorrentes do acúmulo sem precedentes de poluentes na atmosfera.
Em essência, esses cientistas estão dizendo às pessoas de todas as nações que o aquecimento global causado pelas atividades humanas tornou-se uma séria ameaça ao nosso futuro comum e deve ser confrontado. (...) Apesar das claras evidências disponíveis ao nosso redor, existem muitas pessoas que continuam a acreditar que o aquecimento global não é problema coisa nenhuma. E não é para menos, porque são alvo de uma campanha enorme e muito bem organizada de desinformação, impulsionada pelo governo [do ex-presidente George Bush] e fartamente financiada por empresas poluidoras que estão determinadas a deter qualquer ação que reduza as emissões de gases que contribuem para o efeito estufa, que causa o aquecimento global, por medo de que seus lucros sejam afetados se precisarem parar de lançar tanta poluição na atmosfera.
Ideólogos de direita ricos se juntaram às empresas mais cínicas e irresponsáveis nos setores de petróleo, carvão e mineração para contribuir com grandes somas de dinheiro para financiar grupos de fachada pseudocientífica que têm como especialidade semear confusão sobre o aquecimento na mente do público. Publicam um “relatório” enganoso depois do outro, fingindo que existe discordância significativa dentro a comunidade científica em áreas em que, na verdade, há amplo consenso de base.
As técnicas empregadas foram usadas com êxito pela primeira vez anos antes, pela indústria do tabaco, em sua longa campanha para criar incerteza na mente do público a respeito dos problemas de saúde causados pelo fumo. De fato, alguns dos seguidores dessa cartilha que receberam dinheiro das empresas de tabaco durante aquela iniciativa agora estão sendo financiados por empresas de carvão e de petróleo em troca de sua disposição de dizer que o aquecimento global não é real.
No início de 2007, quando o novo relatório científico internacional do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas estava sendo divulgado, um desses grupos de fachada, financiado pela ExxonMobil, ofereceu dez mil dólares por cada pseudo-estudo ou dissertação que contestasse as descobertas da comunidade científica. Esta estratégia foi adotada por décadas pelas empresas mais poluidoras.
Em um memorando franco a respeito de estratégia política para líderes republicanos, o especialista em opinião pública Frank Luntz expressou preocupação de que os eleitores poderiam punir candidatos que apoiavam a poluição, mas ofereceu conselhos sobre a principal tática para desarmar a questão: “Se o público chegar a acreditar que as questões científicas estão definidas, suas opiniões a respeito do aquecimento global vão mudar de acordo com isso. Portanto, é necessário continuar fazendo com que a ausência de certeza científica seja um item fundamental no debate (....).”
No entanto, o governo Bush foi muito além das recomendações de Luntz. No caso da crise global do clima, Bush menosprezou publicamente cientistas de seu próprio governo que redigiram relatórios oficiais ressaltando o perigo extremo que ameaça os EUA e o mundo. No lugar destes documentos, ele preferiu análises com profundas falhas, cheias de interesses particulares, financiadas pela maior empresa de petróleo do mundo, a ExxonMobil. Chegou até a censurar elementos de um relatório da Agência de Proteção Ambiental que falava do aquecimento global e mandar substituir parte do conteúdo do relatório oficial do governo por trechos do documento da ExxonMobil. As consequências de aceitar o conselho da ExxonMobil – de não fazer nada para conter o aquecimento global – são quase impensáveis.
A ExxonMobil teve influência especial sobre o (...) governo [de George W. Bush] e tem sido mais ativa que qualquer outra empresa poluidora em suas iniciativas descaradas para tentar manipular as percepções públicas da realidade e da seriedade da crise climática. Diversas organizações dedicadas à integridade científica apontaram o dedo para as práticas vergonhosas da ExxonMobil, mas, até agora, sem resultados.
A Sociedade Real − o equivalente no Reino Unido à Academia Nacional de Ciências dos EUA – renovou formalmente seu pedido para que a ExxonMobil parasse de disseminar ao público informações “imprecisas”, “que induzem a muitos erros”, que “não condizem” com o que se aceita na comunidade científica a respeito da crise climática. A Sociedade Real também solicitou à ExxonMobil que pare de pagar milhões de dólares por ano a organizações que “representam de maneira enganosa a ciência das mudanças climáticas, pela negação total das evidências de que os gases responsáveis pelo efeito estufa são responsáveis pelas alterações no clima, ou por exagerar a quantidade e a importância da incerteza relativa ao conhecimento, ou por transmitir uma impressão falsa a respeito dos impactos potenciais da mudança climática antropogênica.” [1]
Outra organização de cientistas, a norteamericana União de Cientistas Responsáveis (Union of Concerned Scientists, UCS) preparou um extenso relatório em 2006 mostrando que “a Exxon Mobil pagou quase 16 milhões de dólares entre 1998 e 2005 a uma rede de 43 empresas de defesa de causas que buscam confundir o público a respeito da ciência do aquecimento global.”
“A ExxonMobil produziu incerteza a respeito das causas humanas do aquecimento global, da mesma maneira que as empresas de tabaco negaram que seu produto causava câncer de pulmão”, disse Alden Meyer, diretor de estratégia e planos de ação da UCS. “Investimentos modestos, porém eficientes, permitiram que a gigante do petróleo alimentasse dúvidas a respeito do aquecimento global para postergar ações do governo, da mesma maneira que o tabaco fez por mais de quarenta anos.”
Dois senadores dos EUA, a republicana Olympia Snowe, do Maine, e o democrata Jay Rockefeller, da Virgínia Ocidental, também se uniram à iniciativa crescente de persuadir a ExxonMobil a se comportar de maneira ética. Os dois senadores disseram que a ousada e descarada iniciativa da ExxonMobil para disseminar a ignorância e a confusão a respeito da crise climática “prejudicou a reputação dos EUA”. Dizendo que a representação errônea que a ExxonMobil faz da ciência não é honesta, manifestaram-se contra “o extenso financiamento da Exxon Mobil a uma câmara de eco’ de pseudociência que não conta com a aprovação de especialistas.”
O motivo que a Exxon Mobil tem para se envolver nessa iniciativa extraordinária e incansável de dissimulação em massa com certeza não tem mistério nenhum. No início de 2007, a empresa anunciou o maior lucro no ano anterior, 2006, de qualquer corporação da história do país.
NOTA:
[1] “Antropogênica”: causada pela civilização humana.
O texto acima é um trecho da obra “O Ataque à Razão”, de Al Gore, Ed. Manole, SP, 2007, pp. 179-182.
Veja os textos da seção “Crise Climática e Mudança de Civilização”, no website www.filosofiaesoterica.com. Sobre a relação entre as ideias de Al Gore e a filosofia esotérica, leia ali o artigo “Al Gore e a Tradição Esotérica”.

Texto obtido no endereço:
http://transnet.ning.com/profiles/blog/show?id=2018942%3ABlogPost%3A30646&xgs=1

terça-feira, 26 de maio de 2009

Diferenças


Por Roberto Recinella

As diferentes formas de agir e pensar é que geram o conhecimento, imagine se todas as pessoas tivessem as mesmas necessidades, pensamentos, sentimentos e etc... estaríamos vivendo em mundo paralisado e estagnado pois são as nossas diferenças um dos fatores responsáveis por nossa evolução, mas a verdade é que existe algo polêmico hoje em dia, podemos chamá-lo de paradoxo, as pessoas temem mostrar o que realmente são, isto acontece por que apesar de sabermos que somos diferentes entre si, a maioria das vezes não respeitamos essas diferenças e tentamos impor o "nosso" jeito de ser, infelizmente isso ocorre em um nível subconsciente e nem percebemos que estamos desrespeitamos uma opinião ou percepção diferente da nossa .
Podemos dizer que essa atitude apesar de inconsciente é alimentada pela nossa própria ignorância em compreender e lidar com as diversas percepções de um mesmo mundo sob os olhos dos outros, e com isso impedimos o nosso crescimento perdendo a oportunidade de aprendermos, e inibindo as pessoas à nossa volta de se expressarem em sua plenitude por puro receio de serem julgadas, assim tornando-se um habito não questionar ou opinar sobre o mundo que nos rodeia.

Precisamos nos atrever a ser o que somos, pois é nesse aspecto que reside o brilho. Há uma aura que envolve aqueles que adotaram essa ousadia. E é nessa aura que muitos tomam refúgio, porque quando as pessoas não conseguem sustentar suas máscaras, elas correm na direção daqueles que se desnudaram do prejuízo.
“O homem é um eterno observador dos outros, nunca de si mesmo.”
Diferenças
Um sujeito estava colocando flores no túmulo de um parente, quando vê um chinês colocando um prato de arroz na lápide ao lado. Ele se vira para o chinês e pergunta:
- Desculpe, mas o senhor acha mesmo que o defunto virá comer o arroz?
E o chinês responde:
- Sim, quando o seu vier cheirar as flores!

Respeitar as opções do outro, em qualquer aspecto, é uma das maiores virtudes que um ser humano pode ter.
As pessoas são diferentes, agem diferentes e pensam diferentes. Nunca julgue, apenas compreenda–as.

segunda-feira, 25 de maio de 2009

A liderança e a ética



"Nada lhe posso dar que já não existe em você. Não posso abrir-lhe outro mundo de imagens, além daquele que há em sua própria existência. Nada lhe poderei dar, a não ser a oportunidade, o impulso a chave. Eu o ajudarei a tornar visível o seu próprio mundo."
(Hermann Hesse)

A liderança é um processo que pessoas comuns utilizam, quando recorrem ao que há de melhor em si mesmas e nas outras pessoas.
Dessa perspectiva podemos identificar o desenvolvimento da liderança ao próprio “des-envolvimento” da pessoa . Um genuíno processo educacional de busca por completude e expressão de potencialidades que se constrói nas interações homem/mundo e que nunca tem fim.
Há um tanto de arte no percurso do aprendizado do líder que se traduz no seu relacionamento com as pessoas de seu entorno. Arte que inspira os liderados a se engajar em aspirações compartilhadas. Arte que se aprende no fazer e na reflexão sobre o que se faz. Arte de não ceder aos valores materiais, destarte o materialismo mecânico e orgânico das nossas empresas, em detrimento aos verdadeiros valores da vida, vida eterna - Deus; Amor.
Essas e outras questões essenciais ao exercício da gestão e da liderança no ambiente organizacional, estão presentes nas reflexões e práticas da ética global, nesse contexto que é predominantemente desafiador à própria ética.
Nada pode encaminhar a raça humana à degradação mais rapidamente do que líderes desprovidos de qualidade moral.
Exatamente por isso, se você for um liderado, fuja de gestores assim. Se você for um líder, invista no seu polimento intelectual, profissional, mas sobretudo no comportamental e espiritual.
No fundo reportamo-nos sempre a mesma e crucial questão: o futuro depende dos valores de hoje, inclusive à própria possibilidade da existência desse futuro.
Por Carlos Roberto Sabbi

domingo, 24 de maio de 2009

A complicada arte de ver

Colunista da Folha de S.Paulo
Ela entrou, deitou-se no divã e disse: "Acho que estou ficando louca". Eu fiquei em silêncio aguardando que ela me revelasse os sinais da sua loucura. "Um dos meus prazeres é cozinhar. Vou para a cozinha, corto as cebolas, os tomates, os pimentões _é uma alegria! Entretanto, faz uns dias, eu fui para a cozinha para fazer aquilo que já fizera centenas de vezes: cortar cebolas. Ato banal sem surpresas. Mas, cortada a cebola, eu olhei para ela e tive um susto. Percebi que nunca havia visto uma cebola. Aqueles anéis perfeitamente ajustados, a luz se refletindo neles: tive a impressão de estar vendo a rosácea de um vitral de catedral gótica. De repente, a cebola, de objeto a ser comido, se transformou em obra de arte para ser vista! E o pior é que o mesmo aconteceu quando cortei os tomates, os pimentões... Agora, tudo o que vejo me causa espanto."


Ela se calou, esperando o meu diagnóstico. Eu me levantei, fui à estante de livros e de lá retirei as "Odes Elementales", de Pablo Neruda. Procurei a "Ode à Cebola" e lhe disse: "Essa perturbação ocular que a acometeu é comum entre os poetas. Veja o que Neruda disse de uma cebola igual àquela que lhe causou assombro: 'Rosa de água com escamas de cristal'. Não, você não está louca. Você ganhou olhos de poeta... Os poetas ensinam a ver".
Ver é muito complicado. Isso é estranho porque os olhos, de todos os órgãos dos sentidos, são os de mais fácil compreensão científica. A sua física é idêntica à física óptica de uma máquina fotográfica: o objeto do lado de fora aparece refletido do lado de dentro. Mas existe algo na visão que não pertence à física.
William Blake sabia disso e afirmou: "A árvore que o sábio vê não é a mesma árvore que o tolo vê". Sei disso por experiência própria. Quando vejo os ipês floridos, sinto-me como Moisés diante da sarça ardente: ali está uma epifania do sagrado. Mas uma mulher que vivia perto da minha casa decretou a morte de um ipê que florescia à frente de sua casa porque ele sujava o chão, dava muito trabalho para a sua vassoura. Seus olhos não viam a beleza. Só viam o lixo.
Adélia Prado disse: "Deus de vez em quando me tira a poesia. Olho para uma pedra e vejo uma pedra". Drummond viu uma pedra e não viu uma pedra. A pedra que ele viu virou poema.
Há muitas pessoas de visão perfeita que nada vêem. "Não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores. Não basta abrir a janela para ver os campos e os rios", escreveu Alberto Caeiro, heterônimo de Fernando Pessoa. O ato de ver não é coisa natural. Precisa ser aprendido. Nietzsche sabia disso e afirmou que a primeira tarefa da educação é ensinar a ver. O zen-budismo concorda, e toda a sua espiritualidade é uma busca da experiência chamada "satori", a abertura do "terceiro olho". Não sei se Cummings se inspirava no zen-budismo, mas o fato é que escreveu: "Agora os ouvidos dos meus ouvidos acordaram e agora os olhos dos meus olhos se abriram".
Há um poema no Novo Testamento que relata a caminhada de dois discípulos na companhia de Jesus ressuscitado. Mas eles não o reconheciam. Reconheceram-no subitamente: ao partir do pão, "seus olhos se abriram". Vinícius de Moraes adota o mesmo mote em "Operário em Construção": "De forma que, certo dia, à mesa ao cortar o pão, o operário foi tomado de uma súbita emoção, ao constatar assombrado que tudo naquela mesa _garrafa, prato, facão_ era ele quem fazia. Ele, um humilde operário, um operário em construção".
A diferença se encontra no lugar onde os olhos são guardados. Se os olhos estão na caixa de ferramentas, eles são apenas ferramentas que usamos por sua função prática. Com eles vemos objetos, sinais luminosos, nomes de ruas _e ajustamos a nossa ação. O ver se subordina ao fazer. Isso é necessário. Mas é muito pobre.
Os olhos não gozam... Mas, quando os olhos estão na caixa dos brinquedos, eles se transformam em órgãos de prazer: brincam com o que vêem, olham pelo prazer de olhar, querem fazer amor com o mundo.Os olhos que moram na caixa de ferramentas são os olhos dos adultos. Os olhos que moram na caixa dos brinquedos, das crianças. Para ter olhos brincalhões, é preciso ter as crianças por nossas mestras. Alberto Caeiro disse haver aprendido a arte de ver com um menininho, Jesus Cristo fugido do céu, tornado outra vez criança, eternamente: "A mim, ensinou-me tudo. Ensinou-me a olhar para as coisas. Aponta-me todas as coisas que há nas flores. Mostra-me como as pedras são engraçadas quando a gente as têm na mão e olha devagar para elas".
Por isso _porque eu acho que a primeira função da educação é ensinar a ver_ eu gostaria de sugerir que se criasse um novo tipo de professor, um professor que nada teria a ensinar, mas que se dedicaria a apontar os assombros que crescem nos desvãos da banalidade cotidiana. Como o Jesus menino do poema de Caeiro. Sua missão seria partejar "olhos vagabundos"...
*Rubem Alves, 71, educador, escritor. Livros novos para crianças e adultos-crianças: "Os Três Reis" (Loyola) e "Caindo na Real: Cinderela e Chapeuzinho Vermelho para o Tempo Atual" (Papirus).

sábado, 23 de maio de 2009

O Poder da Gentileza


Por Rosana Braga

Como e quando você se inspirou para escrever “O poder da gentileza”?

Rosana Braga: Eu já tratava, desde 2003, do tema “Inteligência Afetiva”, que tem muito a ver com essa capacidade de se relacionar harmoniosamente com as pessoas, sempre buscando compreender melhor como se comunicar, de que forma ser claro e impor limites sem precisar ultrapassar os limites da boa convivência. Sempre busquei, inclusive, mostrar o quanto a afetividade tem a ver com o desenvolvimento da inteligência humana e de que forma isso contribui para nossa realização pessoal, profissional e amorosa. Certo dia, pensando em como abordar este tema de uma forma ainda mais fácil, me veio uma percepção muito clara: o quanto temos ‘desaprendido’ a acolher o outro, a ter paciência, a compreender que cada um tem suas dificuldades, mas que todos nós desejamos apenas ser felizes... e a palavra GENTILEZA me veio na hora! Comecei a pesquisar sobre o tema e fui encontrando dados surpreendentes, o que me empolgou cada vez mais. Saí de “férias” por uns dias, no início do ano de 2007, como sempre faço quando vou escrever, e o resultado foi este – o livro O PODER DA GENTILEZA, lançado em agosto do ano passado.
Para você, o que é gentileza?
Rosana Braga: Segundo minhas pesquisas e estudos, e também em minha opinião enquanto consultora em relacionamentos, gentileza é um modo de agir, um jeito de ser, uma maneira de enxergar o mundo. Ser gentil, portanto, é um atributo muito mais sofisticado e profundo que ser educado ou meramente cumprir regras de etiqueta, porque embora possamos (e devamos) aprender a ser gentil, trata-se de uma característica diretamente relacionada com caráter, valores e ética; sobretudo, tem a ver com o desejo de contribuir com um mundo mais humano e eficiente para todos. Ou seja, para se tornar uma pessoa mais gentil, é preciso que cada um reflita sobre o modo como tem se relacionado consigo mesmo, com as pessoas e com o mundo.

Para produzir o livro, você utilizou dados de pesquisas em empresas, estimativas e números da OMS (Organização Mundial da Saúde) e situações do cotidiano. Alguma informação específica lhe chamou mais atenção no processo de pesquisa? É possí­vel citar algum dado que você considera interessante?

Rosana Braga: Em relação aos números da OMS, descobri que os dados são assustadores e delicadíssimos, uma vez que a depressão tende a ser, até 2020, a segunda causa de improdutividade das pessoas, seguida apenas das doenças cardiovasculares. Além disso, distúrbios afetivos como ansiedade, depressão e transtorno bipolar crescem absurdamente, sem falar em síndrome do pânico, TOC, entre outros nomes que se tornam cada vez mais comuns entre as pessoas. Diante da indignação que esses dados me causaram, encontrei mais motivos ainda para investir na gentileza e insistir no fato de que é somente agindo de modo coerente com o que realmente desejamos da vida que poderemos viver de modo mais equilibrado, mais produtivo e mais criativo, em todas as áreas. Inclusive, isso vale especialmente na área profissional, já que em minhas pesquisas também descobri que as empresas investem cada vez mais em colaboradores dispostos a contribuir para que o ambiente de trabalho seja harmônico, apresentando bons resultados e evitando prejuízos diretos e indiretos. No final das contas, a idéia é que todos saiam ganhando com a gentileza.

Gostaria de saber se algumas das situações citadas no livro você chegou a vivenciar ou presenciar?

Rosana Braga: Creio que, de uma forma ou de outra, todos os profissionais já experimentaram ou ao menos presenciaram uma situação desagradável, onde não houve gentileza, em seu ambiente de trabalho. Mas não foi exatamente este fato que me motivou a dar ênfase sobre a importância da gentileza no âmbito profissional. Mais do que esta percepção, foi a constatação, através das pesquisas e das conversas que tive com contratantes e contratados, do quanto as empresas têm valorizado, cada vez mais, o comportamento – e aí a gentileza é fundamental e pode fazer toda a diferença no momento em que um empresário seleciona um profissional para sua equipe. Constatei, por exemplo, que não é falta de conhecimento técnico que mais causa demissões e sim o comportamento inadequado, a falta de colaboração, a incapacidade de lidar com os conflitos e de superar as diferenças entre as pessoas de uma mesma equipe de trabalho. Daí, dá pra se ter uma noção do quanto a gentileza tem sido valorizada e esperada nas corporações, nas empresas de modo geral.
De acordo com sua experiência, quais os maiores problemas enfrentados hoje no ambiente de trabalho? Era diferente há alguns anos?
Rosana Braga: Problemas de ordem comportamental, creio que seja a sutil diferença entre competir por meios éticos (realização profissional) e competir por meio de comportamentos mesquinhos e destrutivos (egoísmo). Não acho que era diferente, mas certamente essa exigência aumentada ano após ano, ditando que as pessoas têm de ser realizadas, felizes e bem-sucedidas tem conduzido muitos profissionais a lançarem mão de meios escusos e nada gentis para tentar garantir seu lugar no mercado. Ou seja, percebo, bastante entristecida, o quanto temos nos colocado numa espécie de armadilha, o quanto temos nos deixado sucumbir pelas ilusões da modernidade, o quanto temos nos perdido de nós mesmos e esquecido de nossa capacidade de agir com o coração e de valorizar aquilo que realmente nos preenche, que realmente nos faz sentir felizes e plenos.
Você acha que a gentileza deve começar antes mesmo de ser contratado na empresa, logo no processo de seleção?
Rosana Braga: Acredito que a gentileza verdadeira começa quando uma pessoa compreende de fato o que ela é e qual é o seu poder. Portanto, não se trata de usar a gentileza para conseguir um emprego. Não se trata de um modo de parecer mais contratável, durante um processo de seleção. Ou a pessoa é gentil (e será desde a seleção) ou ela é dissimulada, estrategista e estará sendo gentil apenas para conseguir o que deseja. É justamente isso que faço questão de frisar no livro sobre o que não é gentileza. Ou você é gentil, ou não é! E isso não depende de onde você está, nem com quem. Depende de suas crenças e valores.
É possí­vel ser gentil sem ser tachado de chato e inconveniente? Como?

Rosana Braga: Uma pessoa gentil não é chata, nunca. Não estou falando de pessoas pedantes, que tentam agradar a todos a qualquer custo. Estou falando de pessoas justas, equilibradas, que agem de modo adequado tratando bem a todos por entender que insultos, ofensas e críticas nunca ajudaram ninguém. Alias, ser gentil nada tem a ver com ser bobo e fazer o que todos querem que a gente faça. Muito pelo contrário: quanto mais gentil somos com as pessoas, mais gentil somos também com nossa verdade, com nossos valores. Assim, dificilmente nos aviltaremos em nome de algo que não esteja de acordo com nosso coração. Pessoas que dizem “sim” a todos estão, na realidade, reforçando uma imagem de ‘vítimas da vida’, alimentando um argumento de ‘coitadinhas’, de extremamente boas e injustiçadas. Isso não é ser gentil e demonstra mais uma dificuldade em lidar com sua própria carência do que a força ou o poder contido na gentileza. Aprender a dizer “não” nem sempre é uma tarefa simples. A gente aprende que tem de corresponder às expectativas de quem amamos, desde pequeninos; daí, quando crescemos, não sabemos dizer “não” sem nos sentirmos culpados. Daí para justificar nosso medo de dizer “não”, é um pulo; afinal, é bem mais fácil transferirmos a responsabilidade de nossas limitações para o outro.
Até com aquelas pessoas mais difí­ceis, estouradas, competitivas, é possí­vel manter uma relação cordial? E o que fazer para não se contaminar com a hostilidade dos outros?
Rosana Braga: É possível, mas claro que nem sempre é fácil. É por isso mesmo que trato a gentileza como um “poder”, uma “força” cada vez mais rara. Ser gentil com quem é gentil com a gente, é extremamente mais fácil. Portanto, é justamente nessas situações, ou seja, com as pessoas que não nos tratam de forma gentil, que podemos exercitar essa habilidade e aproveitar para aprender a lidar com a adversidade e a “provocação”, pelas quais sempre passaremos, todos nós. Dedico um capítulo do livro a refletir sobre quem determina nossas atitudes; e isso responde a sua pergunta. Isto é, quando a gente se deixa contaminar pela falta de gentileza do outro é porque estamos deixando que ele decida como a gente deve agir. É o momento de nos apoderarmos de nossos valores e agirmos a partir de nossas próprias crenças sobre o que seja correto.
Você poderia dar alguma sugestão de reflexão, dicas práticas e exercícios para o dia-a-dia que foram citados em seu livro, para os leitores do site?
Rosana Braga: Gostaria de reproduzir aqui 10 dicas que dei no livro, entre outras, para facilitar a prática da gentileza. Creio que se conseguirmos incorporar pelo menos algumas dessas ações, nossa vida já se tornará bem mais leve e gostosa.
1. Tente se colocar no lugar do outro. Isso o ajuda a entender melhor as pessoas, seu modo de pensar e agir.
2. Aprenda a escutar. Ouvir é muito importante para solucionar qualquer desavença ou problema.

3. Pratique a arte da paciência. Evite julgamentos e ações precipitadas.

4. Peça desculpas. Isso pode prevenir a violência e salvar relacionamentos.

5. Pense positivo. Procure valorizar o que a situação e o outro têm de bom e perceba que este hábito pode promover verdadeiros milagres.

6. Respeite as pessoas quando elas pensarem e agirem de modo diferente de você. As diferenças são uma verdadeira riqueza para todos.

7. Seja solidário e companheiro. Demonstre interesse pelo outro, por seus sentimentos e por sua realidade de vida.
8. Analise a situação. Alcançar soluções pacíficas depende de se descobrir a raiz do problema.

9. Faça justiça. Esforce-se para compreender as diferenças e não para ganhar, como se as eventuais desavenças fossem jogos ou guerras.

10. Mude a sua maneira de ver os conflitos. A gentileza nos mostra que o conflito pode ter resultados positivos e ainda tornar a convivência mais íntima e confiável.

Créditos:
Rosana Braga

Reconhecida como uma das maiores especialistas em relacionamentos interpessoais do país, pesquisadora da área há mais de 10 anos, Rosana Braga é conferencista, escritora, jornalista e consultora em relacionamentos. Autora de 5 livros e DVDs de Treinamento, tais como ‘O Poder da Gentileza’, ‘Faça o Amor Valer a Pena’, ‘Inteligência Afetiva – 2 volumes’, entre outros.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Guias e Leis

Para descontrair nessa sexta-feira...
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1- GUIA PRÁTICO DA CIÊNCIA MODERNA:
1. Se mexer, pertence à Biologia.
2. Se feder, pertence à Química.
3. Se não funciona, pertence à Física.
4. Se ninguém entende, é Matemática.
5. Se não faz sentido, é Economia ou Psicologia.
6. Se mexer, feder, não funcionar, ninguém entender e não fizer sentido, é INFORMÁTICA.
2- LEI DA PROCURA INDIRETA:
1. O modo mais rápido de se encontrar uma coisa é procurar outra.
2. Você sempre encontra aquilo que não está procurando.
3- LEI DA TELEFONIA:
1. Quando te ligam: se você tem caneta, não tem papel. Se tiver papel, não tem caneta. Se tiver ambos, ninguém liga.
2. Quando você liga para números errados de telefone, eles nunca estão ocupados.
Parágrafo único: Todo corpo mergulhado numa banheira ou debaixo do chuveiro faz tocar o telefone.
4- LEI DAS UNIDADES DE MEDIDA:
Se estiver escrito 'Tamanho Único', é porque não serve em ninguém, muito menos em você...
5- LEI DA GRAVIDADE:
Se você consegue manter a cabeça enquanto à sua volta todos estão perdendo, provavelmente você não está entendendo a gravidade da situação.
6- LEI DOS CURSOS, PROVAS E AFINS:
80% da prova final será baseada na única aula a que você não compareceu, baseada no único livro que você não leu.
7- LEI DA QUEDA LIVRE:
1. Qualquer esforço para se agarrar um objeto em queda, provoca mais destruição do que se o deixássemos cair naturalmente.
2. A probabilidade de o pão cair com o lado da manteiga virado para baixo é proporcional ao valor do carpete.
8- LEI DAS FILAS E DOS ENGARRAFAMENTOS:
A fila do lado sempre anda mais rápido.
Parágrafo único: Não adianta mudar de fila. A outra é sempre mais rápida.
9- LEI DA RELATIVIDADE DOCUMENTADA:
Nada é tão fácil quanto parece, nem tão difícil quanto a explicação do manual.
10- LEI DO ESPARADRAPO:
Existem dois tipos de esparadrapo: o que não gruda e o que não sai.
11- LEI DA VIDA:
Uma pessoa saudável é aquela que não foi suficientemente examinada.
12- LEI DA ATRAÇÃO DE PARTÍCULAS:
Toda partícula que voa sempre encontra um olho aberto.
13- COISAS QUE NATURALMENTE SE ATRAEM:
  • Mãos e seios
  • Olhos e bunda
  • Nariz e dedo
  • Pobre e funk
  • Mulher e vitrines
  • Queijo e goiabada
  • Chifre e dupla sertaneja
  • Carro de bêbado e poste
  • Tampa de caneta e orelha
  • Moeda e carteira de pobre
  • Tornozelo e pedal de bicicleta
  • Leite fervendo e fogão limpinho
  • Político e dinheiro público
  • Dedinho do pé e ponta de móveis
  • Camisa branca e molho de tomate
  • Tampa de creme dental e ralo de pia
  • Café preto e toalha branca na mesa
  • Dezembro na Globo e Roberto Carlos
  • Show do KLB e controle remoto (Para mudar de canal)
  • Chuva e carro trancado com a chave dentro
  • Bebedeira e mulher feia
  • Mau humor e segunda-feira!
  • Bom humor e a sexta-feira!!!
Recebido por e-mail sem a citação da autoria

quinta-feira, 21 de maio de 2009

O poder da palavra

Pois, muito embora eu relute em postar textos, artigos, etc., sem a devida citação do autor, esse é uma das exceções, pois resumidamente ele traz uma profundidade e um conteúdo imenso que de alguma forma dita a Cabala, esse que é um dos ensinamentos milenares que está a nossa disposição.
Leia e medite sobre o assunto. Garanto que vale a pena.
O texto foi recebido tal qual por e-mail.
Carlos.
Um dos temas mais sérios e práticos que estudamos na cabala é o lashon hará ou maledicência. A quase totalidade das pessoas, independentemente de religião, idade ou classe social, pratica o lashon hará diariamente e experimenta seus indesejáveis efeitos.
O lashon hará se apresenta sob várias formas: a mais conhecida é quando uma pessoa fala a outra sobre os aspectos negativos de uma terceira pessoa. São pequenos machucados na alma, envolvendo neste caso:
1) Quem fala: expressando pura negatividade atrai a mesma negatividade;
2) Quem ouve: recebe toda aquela negatividade destrutiva;
3) De quem se fala: aquele que não ouve, mas sente e se enfraquece.
Este tipo de lashon hará é comum e aparece de muitas maneiras disfarçadas, mas não por isso menos nocivas. Por exemplo, quando você está com um amigo e começa a falar mal do governo, você realimenta a sua negatividade, a de seu amigo e daquele que exerce a função de governante. Mesmo que o governante seja desonesto, se o seu comentário não tiver um caráter construtivo simplesmente não o faça.
Mas existem outros tipos de lashon hará, também nocivos e mais difíceis de serem identificados. Você vive se lamentando sobre si mesmo para os outros."Coitadinho de mim, estou sempre doente, sem dinheiro, insatisfeito". Neste caso, o número de pessoas "machucadas" é de apenas dois, mas o efeito sobre suas vidas é igualmente devastador.
Um terceiro tipo de lashon hará ocorre quando você ouve a maledicência de um outro. Seja seu amigo de infância, seja seu parente mais próximo, quando sentir que este começa a despejar negatividade em seus ouvidos, experimente correr dali e estará fazendo uma nobre ação para ambos.
Enfim, se você, ainda duvida da importância de evitar todo este mal provocado pela negatividade da palavra, experimente um exercício: passe uma semana inteira sem falar mal dos outros, sem falar mal de si mesmo e evitando ao máximo ouvir a negatividade alheia. Prepare-se, não será tarefa fácil, mas o resultado final pode ser um milagre em sua vida.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

A aposta da neurociência

A Aposta da Neurociência: Perspectivas Futuras
Problemas conceituais e metodológicos são facilmente encontrados dentro das teorias psicológicas. Textos e trabalhos teóricos de muitos filósofos da mente tentam resolver este problema ao buscarem uma definição do conceito de mente e a dissolução do problema mente-corpo. A Filosofia da Mente , de modo específico, preocupa-se com esta análise conceitual de teorias por meio de uma investigação científica.
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O surgimento da Filosofia da Mente teve marco inicial no final da década de 40 e início da década de 50 com a publicação de trabalhos científicos do filósofo da mente Gilbert Ryle. Na tentativa de solucionar estes problemas linguísticos como “mente”, “subjetividade”, “inteligência” é que outros teóricos como, por exemplo, Dennett, Searle, Davidson, Nagel e os Churchlands, começaram a desenvolver seus trabalhos daí decorrentes.
As discussões e as tentativas em desfazer a idéia de termos mentalistas surgidas no escopo desta área do conhecimento geraram alguns posicionamentos. Dentre eles, a postura monista ou materialismo, como muitos preferem chamar, tem sido a opção mais acertada, uma vez que a sustentação de seus argumentos filosófico-científicos é demonstrada pela refutação de adeptos de posições dualistas e agnósticas.
Aparentemente, a posição monista não estaria enfrentando maiores problemas no que se refere as suas observações de métodos experimentais confiáveis. Tampouco, preocupa-se com o que chamamos de problema da causação mental – que afirma que estados mentais causam alguma reação física no cérebro, como acreditam os dualistas.

Pensando na Vaca Amarela
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Os monistas, entretanto, defendem que sua teoria conseguiria resolver todos os problemas encontrados pela Filosofia da Mente, inclusive os conceituais, já que “ao produzir ciência não podemos separar qualquer feito científico dos termos e conceitos utilizados para explicá-la”. (João de Fernandes Teixeira)
Sendo assim, o fazer científico deve se pautar em comprovações empíricas cujos resultados não comprometam a linguagem que se utiliza para argumentá-la. Ou seja, não bastam haver investigações científicas sem que para isso haja uma análise conceitual do seu objeto de estudo.
Nesta mesma linha de pensamento as posições materialistas têm em comum a idéia de que não é possível fazer uma divisão entre mente e cérebro. O defensores do materialismo eliminativo, reducionista ou das teorias da identidade, por exemplo, acreditam que a neurociência poderá em um futuro não muito distante comprovar seus postulados: encontrar todos os correlatos neurais para os estados mentais.
Teríamos a certeza de quais regiões cerebrais estariam envolvidas quando se quer pensar em uma vaca amarela, como também, olhando para o cérebro afirmar que se estava, de fato, pensando em tal conteúdo!
A neurociência, portanto, é a aquela que promete enterrar todas as dúvidas geradas pela ciência filosófica. Com o advento de técnicas de neuroimagem será possível pôr em xeque qualquer dúvida gerada pela linguagem psicológica, ou para alguns a folk psychology. Se todo comportamento possui uma base biológica todas as nossas sensações subjetivas poderão ser traduzidas em estados físicos ou cerebrais. Eis a aposta da neurociência!
Texto de Luciane Simonetti e Thiago Strahler Rivero
Edição de Rafaela Sandrini
Original em:
http://filosofiadamenteecognicao.blogspot.com/2009_03_01_archive.html

terça-feira, 19 de maio de 2009

O amor

Por Gibran Khalil Gibran
Foto: Gibran Khalil Gibran

Então, Almitra disse: “Fala-nos do amor.”E ele ergueu a fronte e olhou para a multidão, e um silêncio caiu sobre todos, e com uma voz forte, disse:
Quando o amor vos chamar, segui-o, embora seus caminhos sejam agrestes e escarpados; e quando ele vos envolver com suas asas, cedei-lhe, embora a espada oculta na sua plumagem possa ferir-vos; e quando ele vos falar, acreditai nele, embora sua voz possa despedaçar vossos sonhos como o vento devasta o jardim.
Pois, da mesma forma que o amor vos coroa, assim ele vos crucifica. E da mesma forma que contribui para vosso crescimento, trabalha para vossa queda. E da mesma forma que alcança vossa altura e acaricia vossos ramos mais tenros que se embalam ao sol, assim também desce até vossas raízes e as sacode no seu apego à terra.
Como feixes de trigo, ele vos aperta junto ao seu coração. Ele vos debulha para expor vossa nudez. Ele vos peneira para libertar-vos das palhas. Ele vos mói até a extrema brancura. Ele vos amassa até que vos torneis maleáveis.
Então, ele vos leva ao fogo sagrado e vos transforma no pão místico do banquete divino. Todas essas coisas, o amor operará em vós para que conheçais os segredos de vossos corações e, com esse conhecimento, vos convertais no pão místico do banquete divino. Todavia, se no vosso temor, procurardes somente a paz do amor e o gozo do amor, então seria melhor para vós que cobrísseis vossa nudez e abandonásseis a eira do amor, para entrar num mundo sem estações, onde rireis, mas não todos os vossos risos, e chorareis, mas não todas as vossas lágrimas.
O amor nada dá senão de si próprio e nada recebe senão de si próprio. O amor não possui, nem se deixa possuir. Porque o amor basta-se a si mesmo.
Quando um de vós ama, que não diga: “Deus está no meu coração”, mas que diga antes: "Eu estou no coração de Deus”.
E não imagineis que possais dirigir o curso do amor, pois o amor, se vos achar dignos, determinará ele próprio o vosso curso.
O amor não tem outro desejo senão o de atingir a sua plenitude. Se, contudo, amardes e precisardes ter desejos, sejam estes os vossos desejos: de vos diluirdes no amor e serdes como um riacho que canta sua melodia para a noite; de conhecerdes a dor de sentir ternura demasiada; de ficardes feridos por vossa própria compreensão do amor e de sangrardes de boa vontade e com alegria; de acordardes na aurora com o coração alado e agradecerdes por um novo dia de amor; de descansardes ao meio-dia e meditardes sobre o êxtase do amor; de voltardes para casa à noite com gratidão; e de adormecerdes com uma prece no coração para o bem-amado, e nos lábios uma canção de bem-aventurança.

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Dualidade e Apego


A história do desenvolvimento humano se dá em quatro dimensões: física, emocional, intelectual e espiritual (KÜBLER-ROSS, 1983 e 1995).
É no desenvolvimento destas dimensões que se forma o medo visceral e irracional da morte. Pela intenção e pelo desejo nascemos para esta realidade. (PIERRAKOS, 1990).
Para entrar nesta dimensão dual a alma precisa se apegar ao corpo, o que nos traz já duas grandes realidades com as quais brigaremos grande parte de nossa existência: a dualidade e o apego. (JOHNSON, 1996)
A dualidade se nos apresenta pelos opostos. Conhecemos o salgado e o doce, o quente e o frio, o amor e o medo, a dor e o prazer, corpo e alma, natureza e consciência, o bem e o mal... A espécie humana é expressão de uma divisão em duas partes, anteriores ao nascimento, que se manifesta em muitas formas. A relação dupla da criança a um só tempo com o pai e a mãe é o símbolo dessa divisão. Características masculinas e femininas, oriundas desta relação, se alternarão em nossos comportamentos e relacionamentos todo tempo. Para solucionar este conflito projetamos e transferimos nossa dualidade primária, experienciada nos relacionamentos parentais em praticamente todas as nossas atitudes. A depender da cultura na qual estamos inseridos, atribuiremos a determinados valores o positivo e o negativo. Nesta nossa abordagem, o positivo e o negativo da conclusão de cada uma das fases do desenvolvimento não estão relacionados a bom ou ruim mas sim ao resultado de uma vivência adequada ou inadequada do indivíduo na sociedade. (JOHNSON, 1996)
Quando escolhemos uma das polaridades de qualquer de nossas dualidades, internamente tentamos matar a outra e assim negamos parte de nós que, por não morrer e ter a necessidade de ser ouvida e vista, fica minando nossas intenções na tentativa de ser ouvida e vista e conseqüentemente fica dando-nos experiências cada vez mais sofridas e dolorosas obrigando-nos a vê-la. Em casos extremos, estas experiências podem até nos levar à morte física. Fugimos destas nossas mortes diárias pelo medo visceral da morte física, o que nos impede de viver nossa vida no momento presente. (MAY, 1988)
Apenas quando nos tornamos conscientes de nossas transferências e projeções podemos escolher fazer a entrega para efetuar a transformação com a responsabilidade pelo nosso próprio processo e retornar ao Self. (JUNG, 1964)
Apenas quando nos tomamos conscientes das nossas pequenas mortes diárias, em todas as suas dimensões, somos capazes de viver em plenitude a felicidade que o cotidiano nos traz e caminhar com segurança para nossa morte física. (KÜBLER-ROSS, 1978, GLACER e STRAUSS, 1965).
O apego é a grande causa do sofrimento humano (ALMEIDA, 1995). Sofremos porque perdemos toda e qualquer coisa: sofremos porque perdemos um brinquedo, um carro, uma casa, nossas imagens e ilusões, pessoas queridas... Perdemos, perdemos e perdemos... e sofremos. Entramos aqui num círculo vicioso de perda e dor: por medo da entrega, nos apegamos ao conflito da dualidade, que nos é conhecido, reforçamos o medo, reforçamos o apego, e reforçamos a dualidade...
Como aprendemos em nossa cultura, evitamos a dor, evitamos a perda e fugimos da morte, ou pensamos fugir dela, o que nos mantém presos ao círculo. (BROMBERG, 1994 e PIERRAKOS, 1990).
Extraído do artigo "Origens do Medo da Morte" de Celso Fortes de Almeida e Maria Fernanda C. Nascimento, encontrado em:

domingo, 17 de maio de 2009

O medo da morte


Existe um conto indiano que narra a seguinte história:
Um discípulo procura o seu mestre e lhe pergunta:
- Mestre, qual é o seu segredo para nunca se enfurecer e ser sempre amável? E o mestre lhe respondeu:
- Não sei se posso falar sobre o meu segredo, mas eu sei qual é o seu... E o discípulo curioso, perguntou:
- E qual é o meu segredo?Compenetrado, o mestre disse:
- Você vai morrer em uma semana.
Assustado com as palavras do mestre, o discípulo procurou, na semana seguinte, tratar os amigos e os familiares com muita afeição e, no sétimo dia, deitou-se em sua cama e pediu que chamassem o seu mestre. Quando este chegou, o discípulo lhe disse:
- Abençoe-me, sábio mestre, pois estou morrendo. Após abençoar o discípulo, o mestre lhe perguntou:
- E como você passou a semana? Brigou com a família, com os amigos? E o discípulo lhe respondeu:
- Obviamente que não. Eu os amei intensamente. Após ouvir isso, o mestre lhe falou:
- Você acabou de descobrir o meu segredo. Eu sei que posso morrer a qualquer momento, por isso, procuro ser sempre amável com todas as pessoas de minhas relações.
Curiosamente, muitas pessoas que passam por experiências radicais, como são as experiências de quase morte (EQM), mudam profundamente sua forma de viver, passando a amar e a valorizar muito mais seus familiares, o meio ambiente e as demais pessoas com as quais se relaciona. Essa mudança de sensibilidade é conhecida como metanóia, na qual uma atitude egoísta diante dos fatos é substituída por uma atitude amorosa. O egoísmo é fruto, basicamente, do medo da morte. E a maioria das pessoas teme a morte porque possui uma consciência equivocada, acreditando que a morte é o oposto da vida. Mas, na verdade, o que se opõem à morte é o nascimento.
A vida está além da morte e do nascimento. Ela antecede o nascimento e continua além da morte. O que nós conhecemos por vida é apenas um de seus ciclos, formado por um nascimento e uma morte. Vamos, nesse encontro, chamar esse ciclo de existência.
O egoísmo se alimenta do medo da morte e vice-versa. Todos nós queremos permanecer vivos e como acreditamos que a morte é o oposto da vida, temos medo de morrer e lutamos arduamente por aquilo que acreditamos ser a vida: a matéria.
Acumulando bens materiais, buscando a felicidade no consumo ou na posse de outras pessoas, acreditamos que isso nos faz vivos e nos afasta da morte. Todos desejam viver eternamente. E é justamente isso o que acontece.
A vida é realmente eterna. Apenas cada existência, ou seja, cada ciclo de nascimento e morte, é finito.
Recebi por e-mail sem a citação da autoria.

sábado, 16 de maio de 2009

As trombadas


Estive dezenas de vezes em diversas cidades dos EUA, onde volta e meia me deparava com acidentes de trânsito. Nunca eram pequenas batidas, mas escandalosos acidentes com automóveis destruídos e vítimas fatais, coisas graves mesmo. Eu examinava os arredores: o pavimento perfeito,a sinalização perfeita, áreas de escape à vontade e uma profunda disciplina com respeito às leis de trânsito. Quem já enfrentou um cruzamento sem farol nos EUA e viu cada um respeitando a hierarquia do outro sabe do que estou falando. Por isso eu nunca me conformava:
- Cada baita trombada, sô!
Concluí que a razão é uma só: eles não sabem dirigir defensivamente. Atiram-se às ruas confiando cegamente nos outros motoristas. Têm certeza que ninguém mudará de faixa, ninguém ultrapassará pela direita, ninguém cruzará o sinal vermelho, ninguém trafegará acima do limite. Quando surge um fariseu quebrando as regras, pega todos desprevenidos. Não há tempo para brecar, desviar ou simplesmente deixar passar. E então acontecem as colisões. Aliás, as "trombadas", como se dizia em Bauru.
Quando comparo com o Brasil, não deixo de me divertir. Aqui aprendemos a dirigir defensivamente. Temos certeza que o outro motorista vai mudar de faixa. Que um maluco vai cruzar o farol vermelho. Que um idiota vai ultrapassar pela direita. Que um motoqueiro vai sair do nada pra entrar debaixo do nosso carro. Que o caminhão estará em banguela na descida. Estamos sempre preparados para o pior. Quando batemos, não são "trombadas". São colisões. Um amassado aqui, um arranhão ali, discussões, encheção de saco - e a vida continua.
Pausa. Preciso colocar aqui um "existem exceções" que evitará que uns chatos me encham a caixa postal de emails repletos de "mas".
Voltando ao tema: brasileiros sempre esperam pelo pior. Nossos processos e atitudes sempre têm uma "saída pela esquerda". Sempre há um"colchão". Guardamos sempre uma gordurinha para queimar, uma alternativa para adotar, uma saída de emergência. Nunca somos enxutos, definitivos ou focados em alvos milimétricos. Nossos alvos são grandes, podemos acertar no centro, nas margens... E assim vamos vivendo, como famoso jogo de cintura que às vezes chamamos de "jeitinho".
Quando damos de cara com um estadunidense, japonês ou alemão, é conflito na certa. Esses caras são "sharp". Não têm margens para manobra. Quando têm, as margens fazem parte do plano. Os gringos têm uma expressão ("just in case") que equivale ao nosso "vai que", que eles usam para as exceções. Nós usamos como regra...
Vejo um pouco dessa nossa "flexibilidade" nos italianos, portugueses e latinos em geral. Mas no Brasil ela é meio de vida.
Portanto não é de estranhar que na tal crise global assistimos os EUA e a Europa entrando pelo cano desesperados enquanto aqui vamos levando a coisa com relativa calma. E, por favor, não venham me dizer que o mérito é do Lula. O mérito é de nossa direção defensiva. A gringalhada nunca se preparou para a crise. Nós nascemos nela. Vivemos com ela. Precisamos dela.
O que fazer? Manter o seguro em dia, os reflexos em forma e torcer para que o trânsito melhore. E nunca, jamais, cismar de dirigir aqui comoos gringos fazem lá. Nada disso garante que vamos escapar das trombadas. Mas ajuda para que sejam só trombadinhas.
Xi!...
Luciano Pires
COMENTE ESTE TEXTO: http://www.lucianopires.com.br/idealbb/view.asp?topicID=10241

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Barebacking


'Barebacking' cresce no Brasil e torna-se caso de saúde pública
Vagner Fernandes, Jornal do Brasil
RIO - “Procuram-se HIVs”. Impresso em um caderno de classificados dos jornais das grandes metrópoles, o anúncio não passaria despercebido. Do ponto de vista conceitual, HIV é uma sigla que desperta interesse e hostilidade, fascínio e medo, compaixão e ódio.
Estigmatizada até então como o acrônimo da morte, ela vem ganhando novos contornos etimológicos devido a um grupo de homens que praticam sexo com homens (os HSH), absolutamente crentes na teoria de que o vírus da Aids, se contraído numa relação sexual, pode trazer benefícios para seu cotidiano, libertando-o, de uma vez por todas, do uso do preservativo, aumentando o prazer, proporcionado uma liberdade só experimentada no auge da revolução sexual, na década de 70.
A teoria foi posta em prática. E tem nome: "barebacking" (derivado da palavra barebackers, usada em rodeios para designar os caubóis que montam a cavalo sem sela ou a pêlo).
O termo ficou conhecido internacionalmente como uma gíria para o sexo sem camisinha, praticado de preferência em grupo, em festas fechadas, por homens sorodiscordantes (HIVs positivos e negativos).
“Coisa de macho”, garantem os adeptos. O movimento cresce no Brasil, de forma assustadora, e tornou-se uma questão de saúde pública e motivo de preocupação social.
O Jornal do Brasil teve passe livre em dois desses encontros, batizados de bare party (festa bare).
É a primeira vez que um veículo de comunicação ingressa em reuniões nas quais o leitmotiv, ou fetiche, é praticar sexo com pessoas desconhecidas, que possam, acima de tudo, ser soropositivas. Às cegas, todos são guiados apenas pelo que sentem. E, para facilitar a comunicação, criaram um vocabulário próprio.
Festa da conversão
As orgias são chamadas de conversion parties ou roleta-russa. Entre os convidados, há os bug chasers (caçadores de vírus), o HIV negativo, que se lança ao sexo sem camisinha, e os gift givers (presenteadores), os soropositivos que se dispõem a contaminar um negativo.
São esses os responsáveis por entregar o gift (presente), o vírus. Quem participa de encontros bare confirma: o prazer sem barreiras é o que importa. Quanto à Aids, eles não encaram mais a doença como mortal, porém crônica, com tratamento à base do coquetel.
A contaminação, portanto, elimina o medo e apresenta uma perspectiva futura da naturalidade do contato pleno.
– Sou um barebacker assumido – dispara R. H., 31 anos, geógrafo e cientista social, com pós-graduação nas duas áreas.
– Eu odeio camisinha. Acho uma m... É terrível interromper o sexo para colocá-la. Acaba com o meu prazer. No mais, o bare, para mim, é um fetiche. Eu gosto, apesar de ter contraído o vírus da Aids numa festa. Mesmo assim, faria tudo de novo. Não me arrependo.
A declaração aterroriza, preocupa. E só mesmo ingressando no singular mundo dos barebackers para comprovar o que depoimentos, documentários, teses, livros e outros elementos que abordam o tema tentam desvendar ou explicar.
Na maioria das vezes, não conseguem. O que se testemunha numa festa bare está além da imaginação humana, supera os delírios e o surrealismo de Fellini em obras como Satyricon, ultrapassa a sordidez e o ceticismo pasoliniano em Saló ou 120 dias de Sodoma. Não há limites.
De verdade.
A constatação pôde ser feita em encontros programados para homens de grupos sociais distintos. Na Ipanema da bossa nova, de gente chique “pulverizada” de Dior, Prada, Gucci, Kenzo, Gaultier e Armani, a reunião começa às 22h num casarão de uma das mais movimentadas e conhecidas ruas do bairro.
A mansão, de três andares, é fechada especialmente para a ocasião. O décor é sofisticado. No primeiro pavimento, paredes brancas contrastam com sofás vermelhos. TVs de plasma 42' exibem clipes de Madonna, Beyoncé, Cher, Christina Aguilera ou filmes com astros e estrelas de Hollywood.
As luminárias brancas rebatem a luz dicróica contra a parede, gerando clima de aconchego, e o bar, com bebidas importadas em sua maioria, está sempre livre. Ninguém fica sobre balcão. Não há tumulto. Claro, é uma festa para pessoas escolhidas a dedo, para poucos, no máximo 60 convidados, informados por e-mail.
Há regras, e elas são claras. É condição sine qua non ficar nu ou no, máximo, com uma toalha (cedida pela produção do evento) amarrada na cintura. Quem se recusa é convidado a se retirar.
Outra exigência: o sexo tem de ser praticado nos ambientes comuns de convivência. Ou seja, nada de se trancar em banheiro, em cozinha, em quarto. Ali, todos estão para ver e serem vistos.
E o ritual começa na entrada, quando os participantes tiram a roupa e guardam as peças em um armário, trancado com chave numerada. O funcionamento é semelhante ao de termas, masculinas ou femininas.
A medida, na verdade, serve para evitar a circulação com dinheiro e cartões de crédito. É precaução. Os que desejam consumir bebidas ou aperitivos, apenas transmitem ao barman o número assinalado na chave.
Os itens são lançados no computador e, no fim da festa, a conta é paga no caixa. O mecanismo lembra o adotado por boates e bares do eixo Rio–São Paulo, com suas tradicionais cartelas de consumação mínima. Só que numa festa bare, a bebida ajuda, os petiscos “fortalecem”, mas não são peças-chave para o divertimento.
Circulando pelos outros andares, a prova: na sala de vídeo, um jovem de cerca de 20 anos se entrega ao prazer, cercado por três homens.
Nenhum deles usa preservativo. A cena é chocante. O rodízio de papéis, durante o ato sexual, é comum nessas festas. Faz parte do jogo. O quarteto não frustra as expectativas dos voyeurs reunidos na porta da sala.
Como “astros do sexo”, diante de câmeras e de uma equipe de produção, atuam com vontade em uma performance longa, nada convencional, sem limites. Quem se propõe a ficar sob os holofotes sabe o risco que corre.
Mas é a sensação de perceber a adrenalina disparar e o coração bater aceleradamente devido ao unsafe sex (sexo inseguro) sem pudores e em público que os impulsiona.
Um deles podia ser gift giver e os outros bug chasers. Ou vice-versa. A probabilidade de o gift (o vírus) estar ali, entre eles, era grande. Ninguém se importava.
Quando terminou a primeira das muitas rodadas de sexo, o boy toy lover (brinquedo sexual) do trio foi jogar paciência em um dos quatro computadores, com internet liberada, instalados no segundo andar.
– As pessoas perdem a noção do perigo em busca do prazer – explica Jorge Eurico Ribeiro, 40 anos, coordenador de Estudos Clínicos da Fiocruz.
– E o conceito de barebacking se perdeu. Originária da Califórnia, a proposta é a de festas em que um ou mais participantes, sabidamente positivos, são convocados por um produtor para praticar sexo com os convidados sem o uso de preservativos. Todos têm ciência de que, na reunião, há portadores de HIV. O fetiche consiste exatamente na possibilidade de contrair ou não o vírus. Só que, atualmente, há quem acredite que as festas bare são simplesmente um evento para o sexo sem camisinha com participantes negativos, o que é um grande equívoco.
Ribeiro analisa que os barebackers que não apresentam o raciocínio da conversão imaginam, de fato, que, uma vez soronegativos, se limitarem seus relacionamentos com pessoas igualmente soronegativas, estarão fora do risco. Definitivamente não estão.
Há o espaço de tempo de variável (conhecido como janela imunológica) em que um indivíduo já contaminado pelo HIV pode ter resultados de exames laboratoriais de soronegatividade, ou seja, resultados falso-negativos. Testes HIV não são tão matemáticos como se supõe.
No Brasil, o obscuro universo do barebacking é pouco discutido publicamente por especialistas em sexualidade humana. Ainda não há estudo com precisão estatística sobre o número de praticantes, independente de orientação sexual.
No entanto, os relatórios do Ministério da Saúde com dados de infectados pelo HIV, de 1980 a junho de 2008, dão a pista. Os casos acumulados de Aids no país nesse período foram 506.499. Desses, 333.485 (66%) são homens e 172.995 (34%), mulheres. Em 2007, registraram-se 33.689 novos portadores.
Homo, bi ou hetero, todos praticaram sexo sem camisinha. A irresponsabilidade tem preço. E alto. Dos cofres públicos do governo federal saem cerca de R$ 1 bilhão por ano para tratamento exclusivo de soropositivos. Um paciente consome de R$ 5.300 a R$ 26.700 por ano. Cerca de 20 mil pessoas infectadas iniciam tratamento com anti-retrovirais no país, anualmente.
– Sinceramente, não me preocupo com essa questão e nem me sinto culpado. Não estou nem aí em ser um ônus para o governo – enfatiza R. H.
O Federal Health Research (centro de pesquisas de saúde), órgão governamental americano, divulgou recentemente a informação de que muitos homens com comportamento homossexual, bem como agentes de prevenção contra o HIV, confirmaram que a prática de sexo inseguro está se tornando cada vez mais comum.
Um estudo com 554 homens assumidamente homo ou bissexuais, residentes na Califórnia, apontou que 70% estavam familiarizados com o termo barebacking e que 14% já o haviam praticado, muitos em relacionamentos extraconjugais.
De acordo com a pesquisa, dos homens HIV positivos que participaram do estudo, 22% declararam ser barebackers e 10% dos negativos também tinham feito sexo inseguro nos últimos dois anos.
Não há informações sobre qual o número de pessoas em geral (homo, bi ou hetero) que pratica sexo inseguro nem sobre que motivos as levariam à auto-exposição.
Interesse dos jovens
Nas principais metrópoles, o fenômeno tem chamado a atenção de jovens. Comunidades sobre o tema se espalham por sites de relacionamento como o Orkut. No Rio e em São Paulo, a adesão ganha força.
Na indústria pornô, os filmes bare são os mais procurados. No YouTube, as postagens com cenas de sexo sem o uso de preservativos lideram o ranking das mais assistidas. Muitos dos que não praticam ou não têm coragem para fazê-lo buscam o prazer lançando mão de DVDs ou de vídeos na internet. O conceito de barebacking se dissemina.
– Colocar-se frente à possibilidade de contágio do HIV por meio do barebacking traz motivações psicológicas que podem ir do sadismo ao masoquismo. A possibilidade de uma relação sexual mais livre, com maior contato íntimo e afetivo pode estar encobrindo uma caráter suicida – avalia Paulo Bonança, sexólogo e psicólogo, membro da Sociedade Brasileira de Estudos da Sexualidade Humana e da Associação Brasileira para o Estudo da Inadequação Sexual.
Risco assumido
HIV positivo, o administrador T.W., 45 anos, ratifica a análise de Bonança. Para ele, os adeptos do movimento sabem os riscos da superexposição e, alguns, ressalta, desejam o contágio conscientemente:
– Quem pratica sexo sem preservativo não pode ser considerado ingênuo. Tenho um amigo casado com soropositivo. Ele pediu ao parceiro que o contaminasse. Disse que era por solidariedade, mas acho que é masoquismo.
As observações de Bonança e T.W. foram comprovadas pelo JB em outra festa com a mesma proposta. Dessa vez, na Zona Oeste, a mais de 60 km da reunião em Ipanema.
O encontro, realizado mensalmente em um sítio, é batizado de Vale Tudo e está em sua 17ª edição. De sunga, de cueca ou nus, exigência para entrar, os participantes se divertem ao som de funk. Dos inocentes à la Perlla aos proibidões, compostos pela “galera da comunidade”. Agora não há TVs de plasma, luz ambiente, bebidas ou petiscos sofisticados. Computador?
Nem pensar. É uma zona praticamente rural. O bar improvisado oferece cerveja em latão, sopa de ervilha, salsichão na brasa, batata frita na hora e campari. O sexo, claro, também é praticado sem timidez.
Na varanda do casarão, na sala, nos quartos, na piscina, na grama. O produtor avisa, na entrada, que os preservativos estão disponíveis.
Percebe-se o zelo pela prevenção. A maioria, no entanto, dispensa, sobretudo em se tratando de sexo oral.
As situações são muito parecidas com as da festa na Zona Sul. Geralmente, dois dão o sinal verde e, em poucos instantes, como num formigueiro, três, quatro, cinco ou dez estão reunidos em busca do prazer.
Há um ano e meio, Igor (codinome de J.C., 42 anos, professor dos ensinos fundamental e médio) produz em sociedade com Renato (A.F, 40 anos, militar), a Vale Tudo.
Garante que o encontro não incentiva o bare, é freqüentado só por maiores e que o uso de drogas é proibido. Esses são dois de cerca de 20 itens de uma espécie de manual enviado por e-mail aos convidados.
Ainda está registrado na mensagem:
- Sexo liberal entre todos. A formação de casais ou grupinhos é censurada. Estamos numa orgia e não num consultório matrimonial.
– Menor, cocaína, ecstasy, crack, maconha ou qualquer outra droga são vetados. Mas sempre há os que usam discretamente. Como posso controlar o que os convidados fazem? Se eu vir, peço que se retirem. Mas não vou colocar seguranças. Isso desconfiguraria a proposta da festa. São adultos. Cada um é responsável por seus atos – frisa Igor.
Mesmo sem ser em orgia, quem não usa proteção é 'barebacker'
A prática do sexo sem o uso de preservativo continua a conquistar novos adeptos. As campanhas milionárias do Ministério da Saúde sobre o tema não têm sido lá tão eficazes como deveriam.
E apesar do conceito de barebacking estar associado a orgias freqüentadas por homens que praticam sexo com homens, qualquer pessoa, independentemente de orientação sexual, que busca o prazer sem lançar mão de camisinha é um barebacker.
Também corre o risco de ser infectado, ainda que não seja um participante assíduo das conversion parties, as polêmicas e inconseqüentes festas de roleta-russa, nas quais os convidados brincam com a possibilidade de contrair o vírus HIV.
- Como expliquei, a conceituação de barebacking se transformou ao longo dos anos – ressalta Jorge Eurico Ribeiro, coordenador de Estudos Clínicos da Fiocruz.
– Todos os que praticam sexo sem preservativo, seja homo, bissexual ou hetero, podem ser considerados, atualmente, um bare.
Risco permanente
Ribeiro destaca a necessidade de de todos os que se lançam ao sexo sem camisinhas refletir sobre o polêmico tema e as conseqüências da prática. Os familiarizados com o termo e o movimento partem para o simples "sou contra" ou "sou a favor", estabelecendo-se, assim, dois lados que se mostram inconciliáveis justamente pela falta de consenso sobre a inconseqüência com que muitos homens praticam o unsafe sex. A discussão vai além.
- É importante se informar, pensar e decidir o que se pretende com isso. Ter uma vida saudável passa longe do exercício do bare. A decisão, claro, é exclusivamente pessoal. Da mesma forma que escolheram a orientação sexual, podem assim decidir o que fazer com o próprio corpo - assinala
Números divulgados pelo Ministério da Saúde sedimentam a análise do pesquisador. Em 1996, no Brasil, o índice de heterossexuais com mais de 13 anos contaminados pelo HIV era da ordem de 22,4% do total de 16.938 infectados.
Até junho deste ano, esse percentual saltou para 45,7%. Entre os homo/bissexuais houve uma redução de 32,5% (em 1996) para 27,4% (junho de 2008).
Preço mais alto
Garoto de programa desde 2005, Gabriel Chaves, 22 anos, afirma ser heterossexual e ter namorada. Mas assume que, quando um cliente oferece um valor maior do que o cachê estabelecido para praticar sexo sem preservativo, não pensa duas vezes:
– Tem uns que dobram ou triplicam o valor. Eu não tenho como recusar. Com mulher também é assim. Há homens que pagam mais para transar com elas no pêlo. É um risco, mas eu, por exemplo, procuro conversar antes e, aos poucos, perceber a qualidade do cliente – conta.
Gabriel não foge à regra dos barebackers e poderá fazer parte da estatística no futuro. Embora se autodenomine heterossexual, integra o grupo HSH (Homens que praticam sexo com Homens).
Há 12 anos, o percentual de HSHs infectados era de 24%. Uma década depois, em 2006, eles já somavam 41% do total de soropositivos naquele ano.
Aumento dos índices
Em 2004, a Pesquisa de Conhecimentos, Atitudes e Práticas Sexuais do Ministério da Saúde apontou que o índice estimado de HSHs no Brasil, entre 15 a 49 anos, era da ordem de 3,2 % da população, ou cerca de 1,5 milhão de pessoas.
A partir dessa base populacional, a pesquisa calculou a taxa de incidência da Aids nesse grupo. Foram constatados 226,5 casos para cada 100 mil pessoas. Esse índice é 11 vezes maior do que o da taxa da população geral (de heteros), que é de 19,5 casos por grupo de 100 mil.
O crescimento no número de casos, sobretudo entre os homens, está relacionado ao fato de que toda uma geração, que jamais havia tido contato direto com a Aids, atingiu uma faixa etária sexualmente ativa. Bombardeados por campanhas em favor do uso do preservativo, acabaram desenvolvendo uma certa "imunidade" a elas, crendo que a doença não é um "bicho tão feito quanto pintam".
Quando remédio é desculpa para ficar doente
Difundida principalmente nos Estados Unidos (Califórnia, em primeiro lugar) e na Europa, a prática do barebacking é polêmica.
Os adeptos do bare alegam que, em função dos avanços atuais relacionados ao tratamento anti-HIV e à facilidade de acesso a ele, caso sejam contaminados não perderão em qualidade de vida.
- Temos os anti-retrovirais, medicamentos que inibem a reprodução do vírus e potencializam o sistema imunológico. Isso impede o surgimento de enfermidades oportunistas (Aids) - ressaltam.
Eles ainda defendem como ponto positivo para não abrir mão da prática o fato de a ansiedade e a angústia frente ao possível contágio pelo HIV desaparecerem, assim que se descobrem soropositivos. Isso é sinônimo de libertação, pois que o uso do preservativo passa a ser descartado.
O barebacker está à procura da relação sexual mais livre, com maior contato íntimo e afetivo. As conseqüências, no entanto, relacionadas à prática nem sempre se traduzem de forma positiva, como supõem seus praticantes. Anti-retrovirais não são os únicos responsáveis pela qualidade de vida de um HIV.
Quando expostos, de forma freqüente, a relações de alto risco, os soropositivos podem sofrer o que se chama de “recontágio”, uma nova contaminação, acarretando aumento da carga viral e desencadeamento de queda de imunidade e sintomas.
Além disso, têm grande chance de contrair outras DSTs, tais com sífilis. Isso, certamente, dificultará o tratamento.
“Montar a pêlo”, a tradução literal para barebacking, seria uma lenda urbana se não houvesse comprovação real da prática.
A terrível tendência de comportamento existe. Há, de fato, homens, na maioria homossexuais, que querem ser infectados pelo HIV e outros que têm o prazer de ajudá-los a tornar esse desejo realidade.
Psicólogos, antropólogos e sociólogos teorizam sobre distúrbios de comportamento ou disfunção social. Para o resto do mundo, não passam de estúpidos ou patéticos.
17:59 - 03/01/2009
http://jbonline.terra.com.br/nextra/2009/01/03/e030115675.asp

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