quinta-feira, 1 de maio de 2008

Vitória da razão


Editorial da ‘Folha de SP’, sobre a aprovação da Lei de Biossegurança

O Brasil dá mais um passo para constituir-se na República moderna, aberta, pluralista e laica que deve ser
Editorial publicado nesta sexta-feira:
Representa um avanço para o país a liberação de pesquisas médicas com células-tronco. Por 366 votos a favor, 59 contra e 3 abstenções, a Câmara dos Deputados decidiu que embriões humanos que constituam sobra de tratamentos para fertilidade poderão ser empregados em estudos científicos.
O dispositivo, parte da nova Lei de Biossegurança, significa uma derrota histórica do lobby religioso, que se mobilizou para tentar impedir a aprovação.
Células-tronco embrionárias despontam como a grande esperança da medicina do século 21. Ao contrário de células adultas, elas conservam a capacidade de converter-se em qualquer tipo de tecido, de nervos a ossos.
Especula-se que sejam a chave para o tratamento de várias doenças degenerativas como mal de Parkinson, diabetes e até alguns tipos de câncer. Mais do que isso, imagina-se que com as células-tronco será possível reparar órgãos danificados e até criar ‘peças’ sobressalentes para transplantes.
É claro que tudo isso ainda são hipóteses, que poderão ou não se concretizar. Mesmo que o façam, é importante frisar que ainda estamos a muitos anos de tratamentos não-experimentais efetivos.
É fundamental, contudo, dar início o quanto antes às pesquisas. Sem elas, as visões promissoras relativas às células-tronco jamais se materializarão. O Brasil não poderia ficar para trás nesse tipo de investigação, que tende a se tornar cada vez mais importante em Universidades de ponta da Europa e da Ásia.
Os religiosos se opõem a esse tipo de pesquisa porque ela implica (pelo menos por ora) a destruição dos embriões. Para instituições como a Igreja Católica, a vida é sagrada desde a concepção.
Trata-se de uma visão de mundo absolutamente respeitável, mas que se baseia num dogma não-partilhado por outras crenças ou pelo conjunto da sociedade. Não seria razoável que toda a população se visse privada dos potenciais benefícios das células-tronco apenas para não violentar a consciência de alguns.
No mais, a nova lei apenas autorizou a pesquisa com embriões excedentes de tratamentos de fertilidade, que acabariam sendo destruídos de qualquer maneira ou mantidos congelados ‘in aeternum’.
A rigor, o dispositivo aprovado pelo Congresso ainda é um tanto conservador, ao proibir a chamada clonagem terapêutica, isto é, a criação de embriões geneticamente idênticos ao paciente para servir-lhe de banco de células.
A utilização dessa técnica, que poderá revelar-se importante no futuro, eliminaria por completo o problema da rejeição, que ainda impõe dificuldades em alguns tipos de transplante.
Apesar desse detalhe, o saldo da novela que foi a aprovação da Lei de Biossegurança é positivo.
O Congresso mostrou um sábio pragmatismo ao liberar o cultivo de organismos transgênicos após avaliação técnica de segurança e ao permitir a pesquisa com embriões humanos já fadados à destruição.
Com isso, o Brasil dá mais um passo para constituir-se na República moderna, aberta, pluralista e laica que deve ser.
(Folha de SP, 4/3)


Um comentário:

  1. A natureza é sábia: "Pesquisa com células embrionárias fracassou" (www.andoc.es/)
    Foi declarado pela Dra. Natalia López Moratalla, catedrática de Biologia Molecular e Presidente da Associação Espanhola de Bioética e Ética Médica, que "as células-tronco embrionárias fracassaram; a esperança para os enfermos está nas células adultas". Durante a conferência que foi organizada pela Associação Nacional para a Defesa do Direito à Objeção de Consciência (ANDOC), na Academia de Medicina de Granada, a pesquisadora afirmou que "hoje a pesquisa derivou decididamente para o emprego das células-tronco 'adultas', que são extraídas do próprio organismo e que já estão dando resultados na cura de doentes".
    Segundo López Moratalla, "existem cerca de 600 protocolos que utilizam células-tronco adultas, e não se apresentou nenhum com células de origem embrionária". As células adultas "possuem o mesmo potencial de crescimento e de diferenciação das células-tronco embrionárias - células iPS (induced pluripotent stem (iPS) cells) - e substituem muito bem as possibilidades de biotecnologia sonhadas para aquelas".
    "As últimas descobertas sobre as possibilidades terapêuticas das células-tronco adultas põem em suspeita, abertamente, as duas grandes 'promessas' propiciadas pela nova lei espanhola de biomedicina: o uso e criação de embriões para pesquisa, e a chamada clonagem terapêutica. Aos graves problemas éticos já conhecidos (a destruição indiscriminada de milhares de embriões humanos), se unem evidências científicas que questionam cada vez mais sua utilidade terapêutica", afirmou a pesquisadora.
    "As células-tronco embrionárias fracassaram. Pelo peso de sua própria irracionalidade, caiu o uso terapêutico de células provenientes de embriões gerados por fecundação ou de células humanas provenientes da transferência nuclear a óvulos (o que se conhece por clonagem terapêutica)", reiterou.
    Neste sentido, Natalia López Moratalla afirmou que "é uma exigência ética da pesquisa dar uma informa�ção veraz à sociedade e que possa decidir com conhecimento os aspectos da política científica que lhe refere; entre outros que possa incentivar ou frear a dedicação de recursos a um campo promissor, ao mesmo tempo em que se evite criar expectativas irreais diante de determinadas enfermidades, ao menos a curto prazo".
    "A expectativa com a qual foram recebidas as células-tronco, e o fato de que desde o início as células de adulto tiveram que competir com as embrionárias, como alternativas à grande promessa de cura de graves enfermidades, ocasionou que a divulgação dos avanços se visse pressionada por uma certa pressa em que mostrassem sua eficácia. É preciso o esforço por envolver esta pesquisa com a serenidade que toda pesquisa requer".
    É importante acrescentar as palavras do Dr. Shynia Yamanaka, mencionadas em seu recente artigo de revisão: "Embryonic stem cells are promising donor cell sources for cell transplantation therapy, which may in the future be used to treat various diseases and injuries. However, as in the case for organ transplantation, immune rejection after transplantation is a potential problem with this type of therapy" ('Pluripotency and nuclear reprogramming', Philos Trans R Soc Lond B Biol Sci, 363(1500):2079-87, Jun 2008).

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