quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Declaração de Ética Mundial - parte V


2. Compromisso com uma cultura da solidariedade e uma ordem econômica justa
Inúmeras pessoas, em todas as regiões e religiões, esforçam-se por praticar solidariedade umas com as outras, e por viver uma vida de trabalho e cumprimento leal de uma profissão. Ainda assim, no mundo de hoje há muita fome, pobreza e miséria. O indivíduo não é o único culpado por isso. Freqüentemente, a culpa é de estruturas sociais injustas: milhões de pessoas não têm trabalho, milhões são explorados através de um trabalho mal remunerado, são postos à margem da sociedade e privados de chances em suas vidas. Em muitos países, as diferenças entre ricos e pobres e entre poderosos e desvalidos são assustadoras. Neste mundo em que tanto um capitalismo desenfreado quanto um socialismo estatal totalitário esvaziaram e destruíram muitos valores espirituais, puderam difundir-se uma ânsia desenfreada por lucro e uma avidez sem limites, mas também uma mentalidade reivindicatória materialista, que sempre exige mais e mais do Estado, sem assumir maior compromisso recíproco. Não apenas nos países em desenvolvimento, mas também nos países industrializados a corrupção desenvolveu-se na sociedade como uma chaga cancerosa.
A. Das grandes tradições éticas e religiosas antigas, porém, acolhemos o preceito: Não roubarás! Ou, formulado positivamente:
Aje de maneira justa e honesta! Ora, recordemos uma vez mais as conseqüências desse antigo preceito: pessoa alguma tem o direito de roubar outra – seja de que forma for –, nem tampouco de violar sua propriedade ou os bens comunitários. Ao inverso, no entanto, pessoa alguma tem o direito de fazer uso de suas posses sem respeitar as carências da sociedade e da Terra.
B. Quando a pobreza extrema predomina, o desamparo e o desespero ganham espaço, e aí sempre se roubará, por força da sobrevivência. Quando se acumulam poder e riqueza indiscriminados, é inevitável que se despertem nos pobres e marginalizados sentimentos de inveja e ressentimento, de ódio mortal e de rebelião. Isso conduz, no entanto, a um círculo vicioso de violência e de reações violentas. Que ninguém se engane: não há paz mundial sem justiça mundial!
C. Por isso, os jovens já deveriam aprender na família e na escola que a propriedade, por menor que seja, cria obrigações. Seu uso deve, ao mesmo tempo, servir ao bem comum. Só assim é possível construir uma ordem econômica justa.
D. Contudo, quando se quer alterar decisivamente a situação dos bilhões de seres humanos mais pobres que vivem neste planeta, é preciso remodelar de forma mais justa as estruturas da economia mundial. A beneficência individual e projetos isolados de ajuda, por mais imprescindíveis que sejam, não são suficientes. É preciso haver participação de todos os Estados e a autoridade das organizações internacionais, para que se chegue a um equilíbrio justo.
A crise de endividamento e a pobreza do Segundo Mundo, ora em dissolução, e tanto mais do Terceiro Mundo, precisam ser conduzidas a uma solução sustentável por todas as partes.
Certamente, os conflitos de interesse serão inevitáveis também no futuro. Nos países desenvolvidos, de qualquer modo, deve-se distinguir entre consumo necessário e desenfreado, entre um uso social e associal da propriedade, entre um uso justificado e injustificado dos recursos naturais, entre uma sociedade de mercado puramente capitalista e outra, orientada tanto social quanto ecologicamente. Os países em desenvolvimento também necessitam de um exame de consciência em nível nacional.
Isso vale em toda parte: sempre que os dominadores oprimem os dominados, as instituições oprimem as pessoas, e o poder oprime o direito, é adequado haver resistência – pacífica, sempre que possível.
E. Ser verdadeiramente humano, no espírito de nossas grandes tradições religiosas e éticas, significa o seguinte:
• Ao invés de se usurpar o poder econômico e político, em meio a uma luta irrespeitosa pelo domínio, deve-se utilizá-lo para o serviço ao ser humano. Precisamos desenvolver um espírito de compaixão com os que sofrem e ter uma preocupação especial com os pobres, deficientes, idosos, fugitivos e solitários.
• Ao invés de um pensamento unicamente voltado ao poder e ao invés de uma política de poder desenfreada, é preciso fazer prevalecer o respeito mútuo em meio à inevitável concorrência que surge na disputa pelo poder, um equilíbrio razoável dos interesses, e uma predisposição para o respeito e a conciliação.
• Ao invés de um desejo insaciável por dinheiro, prestígio e consumo, é preciso reencontrar um novo senso de comedimento e humildade! Pois o ser humano entregue ao desejo perde sua “alma”, sua liberdade, seu desprendimento, sua paz interior e perde, com isso, o que o torna humano.

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