A cultura da permissividade tem enormes vantagens - a começar, naturalmente, pelo abrandamento dos costumes repressivos. A contrapartida também é evidente: a ideia disseminada de que cada um pode, e até deve, fazer e falar o que quiser, mesmo que isso invada o espaço alheio, incluindo os ouvidos. Não dizer o que dá na bola é diferente de contar mentiras. No primeiro caso, quem usa da CONTENÇÃO VERBAL está obedecendo ao mecanismo de freios sociais pelo qual as opiniões próprias são atenuadas de forma a não ofender os sentimentos alheios. No segundo, a verdade é falsificada para tirar algum proveito, nem que seja promover a própria e engrandecida imagem. Quem acha que tem de "pôr para fora" tudo o que pensa e até invoca o pensamento mágico ("Assim não vou ter infarto") na verdade não está no comando de si mesmo. "Viver em sociedade implica abrir mão de certas selvagerias para obter a proteção social que vem da vida em conjunto", diz Roberto Romano. "Nesse contexto, a má-educação, a ganância desmedida, a negligência ao outro, são todos fatores de desagregação social."
O fato
Adriano Vizoni/Folha Imagem
Quando MARTA SUPLICY era ministra do Turismo e disparou o infame "relaxa e goza" para os infelizes vitimados pelas longas esperas nos aeroportos, obedeceu a imperativos próprios: ter papas na língua era o equivalente a viver uma vida de insuportável repressão, como pregava uma tendência psicanalítica dos anos 70. Resultado: passou imagem de arrogância pela classe a que pertence, prepotência pelo posto que ocupava e, incrivelmente para uma pessoa com seu histórico, machismo virulento pela comparação.
A análise
"Na política, alguém que fala o que quer e, principalmente, com um nível de agressividade alto está querendo dizer que é dono da verdade absoluta", analisa Demétrio Magnoli. "Na esfera privada, quem fala o que quer e não se preocupa com o que o outro pensa e sente, além de ser profundamente incivilizado, não permite que uma divergência seja resolvida. O diálogo é cortado antes que produza frutos."
http://veja.abril.com.br/041109/pequeno-manual-civilidade-p-108.shtml
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